quinta-feira, 20 de março de 2014

Sob a luz da historiografia II

16 de setembro de 2013
Ao trazer a baila o tema adaptação/folhetim das seis horas, exibido pela Rede Globo de Televisão, não se pode desprezar a importância da abordagem histórica e contexto social mundial perceptível no trabalho de Duca Rachid e Thelma Guedes, intitulado "Joia Rara". Mais uma vez surpreenderam pela leveza e propriedade do enredo, enquanto mistura de ficção e realidade, já que não existe compromisso ou cobrança de verosimilhança com a realidade, discurso e análise. Contudo, sem perder o liame historiográfico, conduzem indubitavelmente o telespectador a uma viagem pela História Geral, especialmente na do Brasil, meados do século XX.

Aliás, a sutileza empregada na obra nos faz apreciar, comparar, refletir sobre os fatos e/ou acontecimentos históricos de forma contextualizada, conquanto não se possa referendar outros (as), e noutros momentos da programação, seja pela ausência ou impossibilidade de mesma estampa ou moldes do folhetim, ou por restrição, falta de interesse, impropriedade da exibição e/ou público telespectador.

Nesta perspectiva, tem-se no enfoque de época o grande momento de apreensão histórico-cultural e ampliação dos conhecimentos - e eles, os índices de audiência! - haja visto, não ser comum em outros horários algo que não seja verdadeiro apelo ao consumismo e o descarte, futilidades, degradação da família, e até vulgaridade, verdadeiro reforço senão um atentado a moral aos bons costumes em detrimento da cultura de massa que alcança os canais abertos. E neste diapasão, nem todos estão dispostos a grande exposição e/ou exploração anexada pelo veículo de entretenimento. Assim, não se discute as restrições ou qualquer controle visto que a censura, hoje, é individual e o controle literalmente nas mãos pela própria seleção do que se quer.

Enfim, o folhetim propõe a redenção dos indivíduos pelo amor, afeto, respeito, amizade, solidariedade, fraternidade, justiça, fé, dentre outros valores negados, esquecidos ou perdidos na sociedade, inclusive reflexão aos negativos, tais como o egoismo, tirania, vingança, maldade, arrogância, autoritarismo, ódio e violência. Reflete a evolução da sociedade, a expansão do capitalismo em contraposição ao socialismo, as classes sociais, econômicas, políticas, e operárias - o proletariado - pelo surgimento das primeiras indústrias, inclusive a automobilística, a partir da Revolução Industrial, fases e expansões, sobretudo no Brasil, surgimento dos partidos políticos, agremiações, associações, sindicatos, lutas e reivindicações, contudo, mão de obra tacanha, doenças profissionais e/ou oportunas, mutilações, excesso e cançado pekla jornada de trabalho, e, a falta de legislação trabalhista.

O inicio da trama acontece no Monte Everest, a mais alta montanha da terra, localizada na Cordilheira do Himalaia, na fronteira entre a Republica Popular da China e o Nepal, onde Franz Hause (Bruno Gagliasso), Manfred (Carmo Della Vecchia) e Eurico (Sacha Bali) participam de uma escalada. Após uma avalanche, todos são arrebanhados, onde o primeiro foi considerado inicialmente morto, porém, socorrido, consegue sobreviver, estabelece vínculos com monges tibetanos, onde conhece o Budismo e suas filosofias, conhecimentos e compreensão acerca da vida.

A história do casal formado por Bruno Gagliasso (Franz) e Bianca Bin (Amélia), ele, de família abastada, ela, pobre, operária da fábrica do pai dele, Ernest Hause (José de Abreu), joalheiro suíço de renome, arrogante, autoritário, logo, faz-nos lembrar dos contos de Cinderela A Gata Borralheira ou mesmo Romeu e Julieta, haja visto o confronto familiar existente entre  pobres e ricos. Sem desprezar os vilões Manfred (Carmo Della Vecchia) filho bastardo de Ernest, comum para a época em que os "patrões" abusavam das empregadas. No período da Escravidão no Brasil era comum este tipo de envolvimento. Ele (Manfred) e Silvia (Nathália Dill) se unem para infernizar a vida do casal, tal qual nas histórias de contos infantis.

Neste contexto, o irmão de Amélia, interpretado por Domingos Montagner (Raimundo, ou simplesmente "Mundo") é um jovem idealista que enxerga a sociedade numa visão comunista, cujas perspectivas ou retóricas de melhoria de vida, emprego e salário, logo, é percebida/notada. Perseguido como líder, e por seus ideais divergentes da elite dominante é cerceado em vários momentos como baderneiro, preso como revolucionário, instigador ao levante da classe operária, posteriormente é posto em liberdade, e conclamado à presidência do Partido dos Trabalhadores. Ao se candidatar ao cargo, sofre um atentado, reportando-se a história de crimes encomendados e/ou de emboscada, sob o mando de políticos, oligarqueias e cornonéis, ou simplesmente, desafetos. Assemelha-se a história do atentado sofrido por Carlos Lacerda, jornalista, ex-comunista, adversário de Getúlio Vargas, ocorrido na rua Toneleros, RJ.  

Franz e Amélia vivem um tórrido romance que culmina com o casamento e nascimento de uma filha, Pérola (Mel Maia). Porém, pela sordidez e arranjo do sogro Ernest Hause, Amélia será presa juntamente com a sua melhor amiga, Gaia (Ana Cecília Costa), de origem desconhecida, já que foi criada num orfanato, vai reforçar a ligação comunista entre elas. Assim, ambas terão a subtração dos seus filhos - não obstante, a da primeira ser levada para a família do seu marido, o da segunda será enviado para adoção - objetivo da procura incessante de Toni (Thiago Lacerda), seu marido.

Observa-se que a história remonta a perseguição, prisão e desaparecimento de presos políticos, em especial a vida e morte da ativista comunista, Olga Benário, o sistema implantado pela Rússia Comunista (Classe) em contraponto com o da Alemanha Nazista (Raça) - e, paralelamente, o radicalismo autoritário da Itália Fascista - Igualitarismo e/ou Totalitarismo, respectivamente ofertados e/ou imposto para o restante do mundo. Posteriormente, o Imperialismo Ianque desencadeou o Capitalismo (EUA) que, antagonicamente com o Socialismo (URSS), colocou em xeque a hegemonia mundial, respectivamente pela denominada Guerra Fria entre ambos.

Ista ressaltar que Olga Benaro nasceu em Munique, Alemanha, militante comunista a serviço da URSS se infiltrou no Brasil com alguns companheiros para difundir o Intentona Comunista. Teve um envolvimento político-afetivo com Carlos Prestes, líder PCB, (e fundador da Coluna Prestes) vindo a engravidar. Foi perseguida, deportada no governo de Getúlio Vargas e entregue aos nazistas alemães. Após a prisão, e parto, retiraram a sua filha, entregando-a aos seus familiares. Foi torturada e morta numa câmara de gás no campo de concentração de Bernburg durante a Segunda Guerra Mundial. Por ter origem judia, foi um dos alvos de Adolf Hitler. Conquanto, a arte possa imitar a vida, a protagonista do folhetim não deve sucumbir; tampouco, morrer, mas "viver feliz para sempre" com o seu amado como deve ter desejado Olga Benaro Prestes em seus dias de cárcere.

Por óbvio que os autores não deixariam de abordar as tantas perseguições pelas quais se constatou no Brasil, com prisões de pessoas que comungavam ideologias diferentes das do governos da época (artistas, políticos, professores, etc), cuja deportação e exílio estamparam o cenário político brasileiro, e que serviram de pano de fundo em outros momentos históricos, a exemplo, dos Anos de Chumbo ou Ditadura Militar, de mesmo efeito, perseguição, prisão, desaparecimento, exílio, e, finalmente a liberdade conquistada pela Democracia e sua (s) nuance (s).

Ademais, a trama dispensa maiores comentários sobre trilha sonora, caracterização, cenários (Himalaia e/ou Rio de Janeiro - Copacabana e Arcos da Lapa) nas remontagens de pensões, cafés, cabarés com vedetes, coristas, musicais, figurinos. Época em que a Europa servia de espelho e reflexo para o mundo, em especial para o Brasil ou até mesmo para os Estados Unidos, representados por Marylin Monroe (atriz, cantora e modelo dos Anos 60, que seduzia sobretudo os homens de sua época, tão bem interpretada pela atriz Mariana Ximenes, Aurora Linconl, na trama.

"O Budismo é uma religião milenar, muito importante no mundo todo, sobretudo no Oriente, onde ele nasceu. E que vem cada vez mais se aproximando do Ocidente. Mas, acima de tudo, o Budismo é uma maneira de ver a vida e de viver o mundo..." diz, Thelma Guedes.

"Quando criamos os primeiros passos do nosso enredo, percebemos que precisávamos de um período de grandes conflitos, cisões morais, ideológicas, políticas. Acabamos por encontrar entre 1934 e 1945, época que abrange o "antes" e o "depois" da Segunda Guerra Mundial, complementa a autora.

A trama tem previsão de término para 4 de abril. Então, é só conferir...
Afinal, a Vida é a maior Joia Rara.
Identifique-a, eis que o lapidar é possível para qualquer uma!
                                                                                               
Parabéns, aos idealizadores pela obra. O telespectador, agradece...

Até a próxima!



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